Os vinhos portugueses: história, actualidade e futuro

Os vinhos portugueses
A cultura da vinha em Portugal já remonta ao século VII a. C. Diz-se que os Romanos, quando por aqui estiveram, apreciavam muito os vinhos provenientes das redonde­zas de Lisboa e de Setúbal, o que só prova que tinham bom gosto, como qualquer adorador de Baco que tenha provado os vinhos de Colares, Carcavelos e Setúbal (Moscatel) pode constatar.
Mas não ficou por aí a história dos vinhos portugueses. Segundo dizem os historiadores, e são eles quem sabe, o Infante D. Henrique teria enviado caravelas a Chipre e ao Levante buscarem cepas com que, «viticulturalmente» falando, povoaram a Madeira, para grande delícia de futuros «gourmets».
Também os vinhos de Monção, possíveis antepassados dos actuais vinhos verdes, já no século XV, depois de exportados por Viana do Castelo, satisfaziam os mais exigen­tes paladares ingleses. Os hábitos alteram-se, e o consumidor inglês, influenciado por aquilo que na altura ainda não se chamava publi­cidade e «marketing», passou a preferir os vinhos de Riba Doyro, que o Marquês de Pombal, (que aliás tudo leva a crer ter sido entendido na matéria, pois foi da sua quinta de Oeiras que foram «exportados» os primeiros Carca­velos para a Imperial Corte do Meio), estadista de visão, prote­geu, mandando delimitar a região, agora chamada do Douro, com enormes marcos de pedra traba­lhada, dos quais alguns ainda per­manecem nos locais em que foram implantados, criando em 1756, com prerrogativas majestáticas, a Companhia Geral de Agricultura das "Vinhas do Alto Douro, e com­ batendo quaisquer veleidades con­correnciais (mandando arrancar, por exemplo, as vinhas da Bair­rada, medida que só foi desagravada pela Rainha D. Maria, que as mandou replantar).
Historicamente falando, as coi­sas parecem ter ficado neste pé até 1907-1912, altura em que os últi­mos governos da Monarquia e os primeiros da República avançaram com a redefinição da região do Vinho do Porto (que passou a chamar-se do Douro) e instituíram as sete outras regiões demarcadas agora existentes; e, tirando a nova redefinição da região do Douro (em 1932) e a criação do Entre­posto de Vila Nova de Gaia (1926), as coisas ficaram por aí até esta nossa IIª República que, querendo também incensar Dionísio, criou cinco novas regiões demarcadas.
O que representam os vinhos portugueses
Deixando a história, o que é que representam hoje os vinhos portu­gueses? Portugal é um dos principais produtores mundiais de vinho, que é igualmente um dos mais importantes produtos de exportação (cerca de 140 mil euros/ano), mais de 200 mil postos de trabalho (só no sector da produção propriamente dita), cerca de 300 mil explorações vitivinícolas e uma produção média anual de cerca de 10 milhões de hectolitros, dos quais perto de um quinto se destina à exportação. No entanto a produ­ção tem altos e baixos o que leva a que Portugal tenha por vezes de importar vinho para garantir o abastecimento do mer­cado interno, sem faltar aos com­promissos externos já assumidos. Por exemplo, em 1979, importámos 500 mil hl de vinho comum.
Contudo o vinho não é só núme­ros, cifras, graduações e outras coi­sas desse teor, e qualquer de nós que tenha regado lauto repasto com um fino Bucelas ou um encorpado Dão, ou colocado a pedra de remate de frugal refeição com uma cálida de aguardente Moscatel de Setúbal, não deixará de saber que o vinho é também um elemento de convívio, uma fonte de alegria, um fugaz momento a ser relembrado. No entanto, há pessoas que não conhecem os vinhos portugueses, ou que, conhecendo-os empirica­mente, não estão a par das suas denominações e características. Para uns e outros, dá-se a seguir uma breve resenha dos vinhos por­tugueses, suas origens e caracterís­ticas, e como devem ser bebidos.
Vinhos do Porto e da Madeira
Para começar, temos o vinho do Porto, oriundo da região do Douro, que se espraia pelo Vale do Douro acima, de cerca de 100 quilómetros do Porto até à fronteira espanhola. O vinho do Porto tem um teor alcoólico compreendido entre os 19º e os 22° e quanto a cor pode ser branco, aloirado, tinto aloirado ou tinto. Os Vintages (colheitas de um só ano de reconhecida qualidade) envelhecem em garrafa depois de terem sido engarrafados entre o segundo e o terceiro anos de idade.
Os L.B.V.s (Late Bottled Vintages - colheitas tardiamente en­garrafadas) diferem dos anteriores por serem engarrafados entre o quarto e o sexto anos de idade. Há também os vinhos do Porto enve­lhecidos em cascos comuns e com a indicação de idade. O vinho do Porto bebe-se de preferência como aperitivo, para acompanhar queijos ou sobremesas, ou depois dos doces e das frutas. A região do Douro produz, para além do vinho do Porto, vinhos de mesa que são comercializados sob a designação regional de Douro, e, numa pequena mancha de terreno, um vinho generoso que é comercializado sob o nome de Moscatel de Favaios.
O Madeira, vinho licoroso produ­zido na ilha do mesmo nome, tem entre 18º e 20° e pode ser de vários tipos, conforme as castas de que é produzido; o Malvasia é muito doce, encorpado, de cor carregada e acentuado perfume; o Sercial é seco, leve, de cor clara e suave­ mente perfumado; o Verdelho e o Boal são tipos intermédios entre os dois anteriores, sendo o Verdelho mais parecido com o Sercial e o Boal mais parecido com o Malva­sia. Existe também a designação de Solera, que é atribuída a vinhos de determinada colheita e quali­dade comprovada, envelhecidos em casco e que, durante certos períodos e de acordo com determi­nadas regras, poderão ser lotados com outros vinhos. O Madeira pode ser bebido nas mesmas oca­siões que o Porto.
Outros vinhos generosos
O Carcavelos, excelente vinho generoso hoje unicamente produ­zido em uma pequena mancha de 6 há, tem entre 18 e 20° e caracteriza-se pelas suas qualida­des especiais, de aveludado aroma e sabor inconfundível. O Carcave­los deverá ser bebido a acompa­nhar queijos ou depois de frutas e sobremesas.
O Moscatel de Setúbal, vinho generoso produzido nos concelhos de Palmela e Setúbal tem uma gra­duação alcoólica entre os 18º e os 20°, uma tonalidade que vai do topázio claro ao topázio queimado, um perfume suave e um delicado sabor que o torna inconfundível. Pode ser bebido como aperitivo ou para acompanhar queijos ou sobre­ mesas. Nesta região, e suas imedia­ções, também se produzem vinhos de mesa tintos Periquita, que são encorpados, com elevado extracto seco, quando novos com acentuado sabor e aroma a fruto, melhorando com o envelhecimento, e com graduação alcoólica não inferior a 12°.
Os vinhos de mesa
Os vinhos verdes, designação que desde 1973 beneficia do registo internacional de origem e «marca colectiva», e que desde 1949 é reconhecida pelo Office Internacio­nal de la Vigne et du Vin, são pro­duzidos em 45 concelhos do No­ roeste, têm graduações alcoólicas que oscilam entre os 8º e os 11,5°, e elevado teor em ácido láctico e ani­drido carbónico, o que, pelo seu alto poder dessedentante, faz com que os vinhos verdes sejam extre­mamente agradáveis de beber na época quente. Os vinhos verdes brancos vão muito bem com ostras e mariscos de concha. Os tintos são óptimos para se acompanhar carnes vermelhas, grelhados e car­nes guisadas.
O Dão, produzido nas bacias do Dão e do Mondego, em um teor alcoólico médio de 12º e deve ser consumido com crustáceos e pei­xes frios (branco), charcutarias quentes, criação ou caça de penas (tinto muito encorpado), carnes brancas (tinto medianamente encor­pado), carnes vermelhas, grelha­dos e carnes guisadas (tinto encor­pado). O Dão tinto é caracterizado pelo sabor aveludado, pelo deli­ cioso aroma a fruto e pela viva cor de rubi. Melhora com o envelheci­mento, adquirindo cor acastanhada e um acentuado «bouquet». O Dão branco é leve, de cor citrina e tem um acentuado aroma e sabor a fruto, que se deve às cas­tas de que é produzido.
O Colares, vinho de areia produ­zido na freguesia do mesmo nome e em terrenos de areia solta das freguesias de S. Martinho e de S. João das Lampas, todas do conce­lho de Sintra, tem, quando tinto, uma graduação oscilando entre os 10,5º e os 11°; quando novo, é áspero e adstringente, mas o enve­lhecimento faz com que amacie e adquira um extraordinário aroma e uma tonalidade de casca de cebola. Deve ser bebido muito velho e a uma temperatura de 18°, e pode acompanhar charcutarias quentes, criação e carnes brancas. O branco, de teor, alcoólico mais elevado, entre 11º e 12°, apresenta uma cor citrina, é fresco, com um agradável aroma a fruto, também melhora com o envelhecimento e deve ser bebido, o velho, a 12°, e o novo a 10° C. O Colares branco é um excelente acompanhamento para crustáceos e peixes frios.
Por último o Bucelas, vinho branco com graduação entre 11º e 11,5°, produz-se em pequena região centrada na vila do mesmo nome, a 25 km a Norte de Lisboa. Bas­tante acídulo quando jovem e seco, ganha características organolépti­cas inconfundíveis após envelheci­mento. É de se beber o Bucelas com crustáceos e peixes frios, ace­pipes e charcutarias frias ou quentes.
Para além das regiões demarca­ das, existem outras que não o são, como a de Lafões, ilha do Pico, Alentejo, Ribatejo, etc., e ainda outras duas, já referidas, as da Bairrada e do Algarve, em que a implementação prática da demar­cação se encontra presentemente em curso. Não se encontra no âmbito deste artigo pormenorizar as características de cada uma des­tas regiões e dos vinhos que as mesmas produzem, mas não que­ remos deixar de referir o vinho do Pico, néctar que em tempos passa­ dos foi muito apreciado na Corte Imperial Russa e que hoje é desco­nhecido mesmo da maioria dos portugueses que apreciam vinho.
As perspectivas para o futuro
No entanto e regressando ao lado prático das coisas, nem tudo são rosas para os vinhos portugue­ses. É certo, que o momento difícil da acessão de vendas de vinho às então colónias já foi ultrapassado, mas levantam-se agora os proble­mas decorrentes da integra­ cão de Portugal na União Europeia, problemas que só poderão ser resolvidos melhorando­ -se e estandardizando-se qualida­des, rentabilizando-se uma produ­ção com métodos por vezes data­dos e combatendo-se a excessiva pulverização da propriedade vitivi­nícola.
De tudo isto e da vontade de todos, produtores, expositores e organismos oficiais, depende que os vinhos portugueses continuem a manter a imagem de alta qualidade com que presentemente contam e mesmo que a consigam melhorar no futuro.

5 comentários:

  1. Ótimo artigo, amigo!
    Adoro vinhos. Inclusive, tenho muito material a respeito dos tipos.

    Um abraço,
    Pitanga.

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  2. KM, que artigo especial. Pretendo reproduzir em sinópse, em meu Blog do Varejo, linkando ao seu blog, Ok?
    Abraço, Edu

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  3. Olá,
    Estou a fazer uma pesquisa sobre vinhos em Portugal pra um projeto em parceiria de duas universidade, aqui, no Brasil e aí. És pesquisador ou o que? Gostaria de trocar idéias?
    Obrigada,
    Glaucia

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  4. Eu pouco bebo, mas minha mulher gosta de vinho, inclusive de alguns vinhos portugueses. Um abraço. Drauzio Milagres.

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