Esterilidade e fertilidade

ESTERILIDADE E FERTILIDADE
A média estatística diz-nos que entre dez e quinze por cento dos casais que querem ter um filho não conseguem que a mulher fique grávida depois de um ano em que mantêm relações regulares sem usar ne­nhum método anticonceptivo. Apesar da sobrepopulação que apresenta hoje em dia o mundo moderno a incidência de casais estéreis aumentou consideravelmente e converteu-se num problema que afecta milhões de homens e mulheres em todo o mundo.
Distintos factores, tanto sócio-económi­cos como fisicopsíquicos, justificam este fenómeno. Na sociedade ocidental, o desenvolvimento económico, e o acesso aos métodos de contracepção, favoreceram a integração da mulher no mundo laboral, científico, político e económico. Este novo rol determinou que, em muitos casos, a maternidade passasse para segundo plano ou simplesmente fosse adiada para idades mais avançadas.
Como se sabe, a fertili­dade na mulher diminui com a idade, pelo que só este último já é um factor impor­tante no aumento da incidência de casais estéreis. Também influenciam outros factores resultantes da nossa forma de viver no século XXI, como a frequência de alterações crescente nas trompas de Falópio como consequência de infecções pélvicas causa­ das por doenças de transmissão sexual ou, noutra ordem de coisas, os transtornos provocados por quadros de stress.
Também se poderia dizer que o fácil acesso aos métodos anticonceptivos, que têm a grande vantagem de permitir pla­near ou programar a concepção dos filhos, cria um novo inconveniente: em determi­nadas ocasiões, ao não se conseguir a gra­videz no prazo previsto, surgem situações de intranquilidade e ansiedade - quando de facto, é perfeitamente normal que pas­sem uns meses até se conseguir que a mu­lher fique grávida - que levam os casais a consultar a sua possível esterilidade.
Podemos dividir as causas de esterilidade em três grupos:
--> causas físicas (no homem e na mulher), --> causas psicológicas, --> causas sexuais.
As causas físicas, ou seja, as alterações no sistema reprodutor no homem ou na mulher (algumas vezes consequência, de doenças como a diabetes), são as principais causas de esterilidade, sem que por isso tenhamos que tirar importância aos facto­res de índole psicológica e sexual que podem alterar a fertilidade do casal.
O stress ou a ansiedade provocados tanto pela impossibilidade de conseguir a gravidez desejada, como também por um estado de tensão desencadeado pelos exa­mes e tratamentos aos quais se submete um casal estéril não ajudarão em nada para a resolução do problema.
Não é raro que se produza uma gravidez imediatamente após começar o tratamento ou estudo do problema de fertilidade, facto que pode ser explicado pela tranquilidade criada ao depositar a confiança numa equipa médica que vai oferecer uma solução ao problema. E, em algumas ocasiões, a mulher fica grávida ao abandonar o tratamento, quer seja porque não deu os resultados esperados ou por outras razões, ou inclusive depois de ter formalizado a adopção de um filho.
Como se sabe, todos os factores psicos­somáticos repercutem na relação sexual. As limitações e obrigações impostas por um tratamento - por exemplo, realizar o coito nos dias férteis evitando a ejaculação nos dias anteriores - podem alterar os mecanismos do desejo e a resposta sexual. O círculo vicioso psicossomático que se cria desta maneira pode dificultar enorme­ mente a solução a um problema de esterili­dade. É, então, necessária uma especial - atenção aos factores psicoemocionais no estudo e tratamento da infertilidade de um casal.
Na mulher, as alterações do seu sistema reprodutor podem situar-se em distintos níveis do mesmo. Por isso fala-se de cau­sas vaginais, cervicais, uterinas, tubárias e ováricas. Em alguns casos a sua origem radica numa malformação congénita de órgãos do aparelho genital (por exemplo uma malformação uterina, como o útero bicorne ou a falta de ovários) ou em alte­rações de todo o sistema endócrino (diabe­tes, hipotiroiditis, etc.).
Causas vaginais
São aquelas alterações que impedem o depósito dos espermatozóides na vagina. Podem dever-se a razões físicas (não existe vagina ou há algum impedimento para a penetração), mas na maioria dos casos encontrar-nos-emos perante um problema de disfuncionalidade sexual: ejaculação precoce do homem, vaginismo, dispareu­nia, etc ..
Causas cervicais
Nos momentos próximos da ovulação, o colo uterino produz o que chamamos muco cervical, um fluxo mucoso transpa­rente e elástico, que facilita a subida dos espermatozóides para o útero. Diversas circunstâncias podem alterar as condições do muco cervical (por exemplo uma infecção ou alterações do próprio ciclo de ovulação), impossibilitando a subida do espermatozóide. Também pode existir um problema de incompatibilidade imunoló­gica, no qual o corpo da mulher está a gerar umas substâncias denominadas anti­corpos que actuam contra os espermato­zóides do homem destruindo-os ou imobi­lizando-os.
Causas uterinas
O tecido mucoso que cobre o interior do útero, ao qual chamamos endométrio, deve ter a preparação adequada para per­mitir ao óvulo fecundado aninhar. Deter­minadas alterações hormonais do processo de ovulação podem alterar esta prepa­ração. Da mesma maneira, algumas alte­rações orgânicas, como os tumores (póli­pos ou mi mas ) e as infecções também podem provocar uma alteração da função e da preparação uterina normal.
Causas tubáricas
A trompa de Falópio capta o óvulo quando é expulso pelo ovário correspondente e o desloca. Normalmente, o encontro com o espermatozóide produz-se no terço externo da trompa e, uma vez produzida a fecundação, a trompa continua a transpor­tar o óvulo fecundado até ao útero, onde aninhará. A obstrução tubárica, que cos­tuma dever-se a problemas de tipo infec­cioso mais que a malformações, é aquela alteração da trompa que impedirá este pro­cesso. Pode tratar-se duma obstrução que impeça que a trompa capte o óvulo, que torne impossível o encontro óvulo -esper­matozóide ou a subida do espermatozóide desde o útero e, consequentemente tam­bém da fecundação. Estas obstruções com­pletas são menos frequentes que as alte­rações intermédias que dificultam o pro­cesso.
Causas ováricas
A ovulação ou maturação do óvulo pro­duz-se todos os meses, e é um processo que está controlado pela acção de hormonas produzidas no ovário (estrógenos e pro­gesterona), que pela sua vez obedecem às ordens que lhes são dadas pela hipófise, que é una glândula situada no cérebro que produz as hormonas denominadas F5H (folicoestimulante) e LH (luteinizante). Qualquer alteração na produção de qual­ quer destas hormonas, quer seja no ovário ou na hipófise, pode provocar uma modifi­caçao dos mecanismos da ovulação che­gando mesmo ao ponto de impedi-la. Encontrar-nos-emos com um diagnóstico de não ovulação ou ovulação irregular, que é a causa mais frequente de infertilidade na mulher.
A esterilidade no homem
Os espermatozóides formam-se e amadu­recem nos testículos, concretamente nos túbulos seminíferos, e no epidídimo. Nu­ ma ejaculação normal, de três a cinco centímetros cúbicos de sémen, contabilizam­ se entre quarenta e cento e vinte milhões de espermatozóides por centímetro cúbico. O processo de produção pode ser alterado por diferentes motivos, dando lugar a modificações na quantidade, movimento ou forma dos espermatozóides, de modo que diminuam ou desapareçam as possibi­lidades de fecundação.
Dão-se distintas situações:
Azoospermia: é a ausência de esper­matozóides no sémen, e pode dever-se a que o testículo não os produz ou à obstru­ção ou ausência dos condutores que os transportam (condutores deferentes). Esta situação é grave e difícil de resolver.
Oligospermia e astenospermia: são as alterações do sémen nas quais se observa uma diminuição da quantidade de esper­matozóides (oligospermia) ou de ambas (oligoastenoteratozoospermia). Segundo a gravidade dos casos repercutirá em maior ou menor grau na possibilidade de fecun­dação. Uma quantidade inferior a quaren­ta milhões de espermatozóides por centí­metro cúbico está por baixo do normal, mas ainda assim observaram-se gravide­zes em contagens de menos de vinte mi­lhões por centímetro cúbico.
Estas situações podem dever-se a distintas causas físicas (infecções testicula­res chamadas orquite, traumatismos geni­tais, malformações como varicocele ou cliptoquirdia, etc.), hormonais (insuficiên­cias ou mal funcionamento das glândulas endócrinas, como a hipófise, e outras en­docrinopatias como, por exemplo, a dia­betes) ou, raramente, imunológicas (quan­do o próprio organismo produz anticorpos que matam os espermatozóides).
Quando o casal é estéril
Considera-se que um casal é estéril quando não se consegue uma gravidez depois de dois anos de relações sexuais (coitais) com o objectivo da gravidez. Portanto, o estudo sobre a esterilidade do casal deverá iniciar­ -se depois destes dois anos de espera; sem embargo, normalmente realiza-se antes, quer seja pela idade da mulher ou pela ansiedade do casal. Ainda assim, é impor­tante não se precipitar em fazer exames e tratamentos, já que, muitas vezes, um pouco mais de paciência e a tranquilidade que podem proporcionar umas primeiras sessões de diálogo e informação com uma equipa médica resolvem um grande número de casos.
Em que consiste o estudo da esterilidade?
Trata-se de realizar tanto ao homem como à mulher, uma série de exames com o objectivo de investigar se existe alguma alteração no seu sistema reprodutor que possa ser a causa da esterilidade, tal como se explicou. Esta investigação inicia-se com uma entrevista pessoal em relação com o historial clínico de ambos os membros do casal para estabelecer se há antecedentes patológicos, uma exploração dos órgãos genitais externos e internos - em determi­nadas ocasiões com a ajuda de ecografias -, e diversas análises, como pode ser uma citologia.
Os exames que se realizam em seguida costumam ser:
• Um controlo de temperatura de base da mulher, registada cada manhã antes de se levantar da cama, para saber se há ovulação e em que momento do ciclo se produz. Num ciclo normal, a temperatura depois da menstruação oscila à volta dos 36,5°C, e imediatamente depois da ovulação, aumenta aproximadamente meio grau, mantendo-se elevada entre dez e catorze dias, até à seguinte menstruação. Se não se observa este aumento de temperatura de base, deve-se supor que não existiu ovulação.
• Um teste pós-coital nos dias próximos à ovulação. Este exame realiza-se entre oito a doze horas depois de um coito, com o fim de conhecer o estado do esperma, se a recepção deste por parte da mulher é adequada e se os espermatozóides podem sobreviver no muco cervical. Segundo os resultados deste exame pode suspeitar-se da existência de alterações no sémen masculino ou no muco cervical, ou então um problema de incompatibilidade imunológica.
• Um seminograma, ou seja, uma análi­se do sémen masculino recolhido de uma masturbação e examinado antes de que passe uma 'hora da sua obtenção, para de­ terminar a quantidade, o grau de mobili­dade e a forma dos espermatozóides. É evidente que se se descobre alguma altera­ção, o homem deve ser visto por um an­drólogo para investigar as causas desta alteração e o seu possível tratamento.
Se estes três exames são normais e não permitem um diagnóstico imediato em relação à causa da esterilidade, e depen­dendo de outros factores, como a idade da mulher, o tempo decorrido de infertilida­de, etc., completa-se o estudo com uma bi­ópsia de endométrio. Trata-se de um exa­me que consiste em extrair e analisar uma porção do endométrio, a mucosa que rece­be o interior do útero, com o objectivo de conhecer o grau de preparação uterina e descartar possíveis infecções ou alterações que poderiam interceptar a normal nidação do óvulo fecundado.
Finalmente pode realizar-se uma histe­rossalpingografia, que é uma radiografia de contraste na qual se injecta à mulher um líquido que enche o útero e as trompas de Falópio e que, em casos normais, deve pas­sar à cavidade abdominal e difundir-se pela parte baixa da mesma, o que permite ao investigador observar as possíveis mal­ formações do útero ou obstruções nas trompas.
Estas cinco provas configuram o estudo básico da esterilidade, uma vez realizadas, pode estabelecer-se o diagnóstico e iniciar­-se o tratamento oportuno para conseguir a gravidez. Mas, em determinadas ocasiões o resultado deste estudo básico, ou a não resolução do problema depois do trata­mento indicado farão necessária a elabo­ração de um estudo mais exaustivo, que pode compreender diversas análises hor monais (por exemplo, quando se detecta um problema na ovulação), exames imu­nológicos se se suspeita de que existe incompatibilidade, larascopia e/ou histe­roscopia quando se detectaram indícios de alterações no útero ou nas trompas, etc.
O tratamento da esterilidade
A problemática da esterilidade, tanto no homem como na mulher, é um dos campos nos quais a ciência médica mais avançou. Hoje a medicina pode oferecer uma solução à maioria dos casais que não têm filhos, solução mais ou menos complicada ou com maiores ou menores possibilidades de êxito segundo os casos concretos. E, no caso de que, esgotadas todas as possibili­dades terapêuticas, se estabeleça que o casal está impossibilitado para procriar, ainda faltam, pelo menos duas alternati­vas: a adopção, sujeita às distintas legis­lações de cada país, ou também as diferen­tes formas de maternidade - o que se deno­mina como «mães de aluguer» -, um tema polémico e discutido pelas suas reper­cussões éticas, legais e psicológicas.
Os tratamentos para os casos de esterili­dade ou as diversas soluções que oferece o que conhecemos por reprodução assistida podem dividir-se em quatro grandes pon­tos: tratamentos cirúrgicos, tratamentos médicos, inseminação artificial e fecun­dação in vitro.
Os tratamentos cirúrgicos
Somente serão necessários nos casos em que existam anomalias do ponto genital que possam influenciar a concepção ou a gestação, como podem ser: a existência de miomas ou outras tumorações uterinas, de malformações dos órgãos genitais inter­nos, de obstruções tubáricas (tanto no homem como na mulher) susceptíveis de serem resolvidas através de uma inter­venção cirúrgica, etc.
Os tratamentos médicos
A maioria são tratamentos hormonais cujo objectivo é restabelecer o equilíbrio endócrino necessário para o correcto funciona­mento dos mecanismos de reprodução tanto no homem como na mulher, que é o caso no qual indiscutivelmente têm maior aplicação.
Na mulher, a administração de estróge­nos a pequenas doses, por exemplo, mos­trou-se muito útil para melhorar as con­dições do muco cervical. O uso de proges­terona é especialmente indicado quando existem problemas relativos à preparação do endométrio. Nos transtornos da ovulação mostraram-se especialmente eficazes os tratamentos com citrato de clomiphene e as injecções de gonadotrofinas (que tam­bém se utilizaram para estimular a função testicular no homem). Mas estes tratamen­tos necessitam de um controlo médico muito estrito, já que apresentam muitos efeitos secundários extremamente difíceis de controlar, sendo o mais frequente de todos a aparição de gravidezes múltiplas de alto risco.
A inseminação artificial
Não se deve confundir a inseminação arti­ficial com a fecundação in vitro: a insemi­nação consiste simplesmente em depositar os espermatozóides na vagina, no colo do útero ou directamente dentro do útero para que estes sigam o seu caminho até à trompa, onde vai ter lugar o processo nor­mal de fecundação do óvulo. A inseminação realiza-se coincidindo com a ovu­lação da mulher. Existem dois tipos de inseminação, a que se faz com o sémen do membro mas­culino do casal e a que se faz com o sémen de um doador, que se obtém normalmente num banco de sémen. As técnicas de inseminação artificial são muito simples, não dolorosas e normal­ mente realizam-se de forma ambulatória.
A inseminação intraconjugal
É a que se realiza com o sémen do marido obtido por masturbação, e que normal­ mente foi preparado ou melhorado em laboratório. O simples facto de depositar o sémen o mais próximo possível do local de fecundação aumenta notavelmente as pos­sibilidades de gravidez, já que, num coito normal, somente uma pequena parte dos espermatozóides expulsos chegam até ao colo do útero.
Opta-se por praticar a inseminação intraconjugal em dois casos distintos: quando havendo uma alteração do sémen, normalmente uma oligospermia, não se conseguiram melhorias depois do trata­mento indicado pelo andrólogo, e quando sendo o sémen normal, existem alterações físicas ou disfunções sexuais que impedem a correcta realização do coito e, por conse­guinte, o depósito de espermatozóides na vagina.
A inseminação com sémen de doador
Quando a causa da infertilidade do casal é uma azoospermia do homem recorre-se ao sémen de um doador. Os bancos de sémen, onde se guarda o sémen congelado, dispõem da informação sobre as caracterís­ticas físicas, especialmente as étnicas, do doador, para assim poder seleccionar as amostras mais adequadas às características do casal, mas guardam o anonimato do doador.
Este tipo de inseminação pratica-se quan­do há uma alteração irreversível que anula as possibilidades de fecundação do sémen do homem, de maneira a que o casal não possa beneficiar das técnicas de insemi­nação com melhoria do sémen nem dos distintos modos de fecundação in vitro com sémen do homem. Excepcionalmente também se realiza no caso de alteração genética do homem que comprometeria a sua descendência.
A fecundação in vitro
A fecundação produz-se quando um óvulo perfeitamente maduro e um espermato­zóide potencialmente fértil se encontram no terço superior de uma das trompas de Falópio. Inicialmente desenvolveu-se a denominada fecundação in vitro, ou seja, a fecundação num meio artificial, pensando naqueles casos em que um problema, nor­malmente uma obstrução, das trompas de Falópio obstaculizava ou impedia o pro­cesso natural. Mas hoje em dia muitos casais, cuja infertilidade se deve a outras causas, beneficiam desta técnica, que alcançou um elevado grau de sofisticação e êxito. Vejamos em seguida os passos que constituem o processo básico de fecun­dação in vitro.
A estimulação da ovulação
No ciclo normal, somente amadurece um óvulo cada mês. Mas para uma fecundação in vitro interessa obter o maior número possível de óvulos, para assim contar com uma probabilidade de êxito superior na fecundação e aumentar as possibilidades de nidação do óvulo fecundado e a sua ges­tação. Por isso realizam-se tratamentos hormonais para induzir à ovulação para conseguir o amadurecimento de vários óvulos.
A recuperação dos óvulos
A mulher submetida a um tratamento indutor da ovulação permanece sob um estrito controlo médico, que inclui ecogra­fias e análises hormonais. Este controlo permite conhecer o êxito do tratamento e o momento pré-ovulatório idóneo para a recuperação dos ovos. A recuperação ou extracção realiza-se através duma punção do ovário e a posterior aspiração dos óvu­los maduros que contém. A punção pode efectuar-se através duma laparoscopia - isto é, com um aparelho especial através do umbigo - ou por via vaginal o labora­ tório estuda-se o material obtido e identi­ficam-se os óvulos.
A inseminação
Uma vez identificados os ovos colocam-se numa bandeja de laboratório que contém um meio de cultivo adequado o mais pare­cido possível às condições naturais do inte­rior das trompas de Falópio. A este cultivo acrescenta-se o sémen masculino, que pode proceder do marido ou de um doa­ dor, descongelado se tinha sido congelado e preparado para aumentar as possibilida­des de fecundação.
A fertilização
Entre 17 e 20 horas depois da inseminação identificam-se os sinais de que a inseminação foi produzida: no citoplasma do óvulo, que agora denominamos zigoto, distinguem-se dois prónuc1eos. O zigoto seguirá com a sua divisão celular para converter-se nas horas seguintes na chamada mórula. De facto, já se trata de um embrião humano.
A transferência
Entre 24 e 30 horas depois de comprovar que se produziu a fertilização, as mórulas serão introduzidas no útero da mulher através duma técnica muito simples seme­lhante à utilizada na inseminação artificial intra-uterina. Costuma administrar-se um tratamento hormonal para garantir uma preparação uterina correcta, de maneira que não existam dificuldades para a nidação do óvulo fecundado.
Quando as trompas de Falópio são nor­mais, pode-se realizar a transferência das mórulas directamente para as trompas para que cheguem ao útero pelo seu caminho natural. Com esta técnica as pos­sibilidades de nidação parecem aumentar, mas, por outro lado, tem o inconveniente de que é necessária uma laparoscopia, o que implica uma anestesia e uma passa­gem pela sala de operações.
As maiores possibilidades de gravidez obtêm-se quando se transferem três ou quatro mórulas para o útero. Quando depois da fertilização se obtém um número superior de óvulos fecundados, procede-se à sua congelação, de modo que possam transferir-se em ciclos posteriores se a gra­videz não se consegue nesta primeira ten­tativa ou se posteriormente o casal deseja uma segunda gravidez.
A comprovação da gravidez
Duas semanas depois da transferência de óvulos efectuam-se as análises adequadas para comprovar que se produziu a gravi­dez. Ainda que se trate de uma etapa muito recente, em alguns casos já é possí­vel detectar se se trata de uma gravidez múltipla e actuar caso necessário.
Os novos horizontes
A partir da fecundação in vitro foram-se desenvolvendo uma série de novas técni­cas de assistência à reprodução que tornam possível a gravidez em situações impensá­veis há uns anos atrás.
• As técnicas de micromanipulação do óvulo (com a microinjecção de espermato­zóides, ou a dissecação parcial da zona pelúcida, que é a membrana que envolve o óvulo) têm como principal objectivo elimi­nar ao máximo os obstáculos que devem superar os espermatozóides para que se produza a fecundação. Usam-se tanto em problemas relacionados com os óvulos da mulher como com a qualidade do esperma do homem.
• A doação de óvulos é uma técnica que se utiliza quando a mulher não os pode produzir, quer seja por carecer de ovários, por patologias disfuncionais destes que outros tratamentos médicos não consegui­ram solucionar, ou porque os seus óvulos apresentam alterações genéticas que cau­sariam doenças hereditárias. Recuperam­-se os óvulos de uma mulher sã (que pode ser uma doadora anónima ou, como prefe­rem algumas pacientes, um membro da sua própria família) e fertilizam-se com o sémen do homem, para transferi-los para o útero da paciente. • Naqueles casos nos quais existem alte­rações de ambos os gâmetas (ou seja, tanto do óvulo da mulher como dos espermato­zóides do homem) pode-se recorrer à doação de embriões obtidos por fecun­dação in vitro com gâmetas sãs de doadores anónimos.
Graças ao desenvolvimento destas téc­nicas, a sociedade dos finais do século XX vive uma autêntica revolução no campo da reprodução humana: hoje em dia a ciência pode oferecer soluções a muitos problemas de esterilidade no casal que há poucos anos pareciam sem solução e definitivos. Se os avanços tecnológicos e científicos continuam pelo mesmo caminho, com pro­cessos cada vez mais simplificados, menos custosos e com possibilidades de êxito, num futuro próximo serão muitos mais os casais que poderão beneficiar das técnicas de reprodução assistida.
Sem embargo, é certo que o desenvolvi­mento e aplicação de algumas destas técni­cas geraram numerosas polémicas sociais sobre o seu alcance ético e legal. Por exem­plo, há pessoas que, por motivos religio­sos, consideram inaceitável a inseminação artificial com sémen de um doador, assim como a doação de óvulos ou embriões. Também se pensou na legalidade de permitir que uma mulher solteira ou sem companheiro estável que deseja uma gra­videz e um filho possa aceder à insemi­nação artificial.
Outro dilema ético aparece relacionado com o uso ou destino dos óvulos fecunda­ dos in vitro que não são transferidos para o útero materno: para alguns grupos de opi­nião, a destruição destes zigotos que sobram equivale a um aborto.
O tema das «mães de aluguer» não é menos problemático: o que se passa se uma vez terminada a gravidez, a «mãe de alu­guer» deseja ficar com esse filho e não entregá-lo ao casal que solicitou a sua cola­boração, ou se os pais recusam uma criança que apresenta malformações físicas ou deficiências psíquicas? É lícito o intercâm­bio de uma função corporal, como o caso da gravidez, simplesmente por uma deter­ minada quantidade de dinheiro?
Em muitos países já existe bastante juris­prudência, ainda que seja contraditória, sobre estes temas, que, em alguns casos se reflecte na sua legislação. Mas os avanços científicos nos campos da reprodução humana e a engenharia celular e genética suscitam, dia após dia, novas e importan­tes questões às quais a sociedade deve dar resposta.

4 comentários:

  1. Bem Detalhado e Explicativo, material muito útil

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  2. Parabéns pelo artigo, bem explicativo.
    Abraço

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  3. Muito obrigada pelos esclarecimentos.
    Gostaria de saber se o tratamento hormonal na mulher com antecedentes de cancro de mama nao pode ser prejudicial. Ouvi antes dizer que as hormonas podem estimular o apareciemento de cancro.Outra questao e, ate que ponto o cosnumo de tabaco, o cafe e stress podem afectar a fertilidade do homem e se ha como tratar isso.

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